Sempre nutri uma grande admiração por
aqueles donos que conseguem ensinar os cães a irem buscar coisas que
eles próprios (os donos) atiram. Uma vez tentei ensinar o meu cão a
fazer o mesmo, mas a coisa não correu bem. Felizmente ou infelizmente, a
criatura tem um feitio que é tal e qual o meu:
– O quê?! Ir buscar coisas que foste
TU a atirar? Não vás lá, para quê! Ai a minha vida! Levanta mas é o rabo
do sofá, ó gordo! Faz-te à vida!
Eu até percebo o ponto de vista do meu
cão; sim, porque – se eu estivesse na sua posição – também não ia. Era o
que mais faltava. Não foste tu que atiraste a bola? Pois. Então vai lá
buscar!
A sociedade contemporânea olha para os
cães como os nossos antepassados olhavam para o comércio de escravos
africanos. De uma forma, até, um tanto sádica. Não há nada de inocente
no ato de atirar uma bola para muito longe, com o intuito de
posteriormente obrigarmos um outro alguém a ir buscá-la por nós. E o
mais grave é que as pessoas encaram esta atividade como um momento de
divertimento familiar; é daquelas coisas que entra naqueles grandes
álbuns de família, que as nossas tias nos mostram de cada vez que vamos
lá a casa almoçar.
Voltando à analogia do comércio de
escravos, vejamos o lado positivo: ao menos os cães entram nos álbuns de
fotografias, não é? Já os escravos africanos… pois. Ora então não se
queixem, cães! Ao menos são escravos com privilégios. E, com sorte, o
vosso dono até vos oferece biscoitos. Qual é o escravo africano que se
pode orgulhar de já ter recebido um biscoito, e de o terem chamado de
“lindo menino”?
Outra coisa que nunca entendi nos cães, é
a forma como marcam o território. Sim, eu entendo que queiram mostrar a
toda a gente que determinado sítio lhes pertence, mas porquê aquele
típico ritual: cheirar, levantar a pata, fazer chichi, cheirar de novo e
ir embora? Porque não: espalhar migalhas de pão pelo sítio a marcar, ao
estilo de Hansel e Gretel? Ou deixar lá uma bandeirola branca,
como fazem aqueles alpinistas que sobem a montanhas muito altas? Sempre
era mais higiénico. Fica aqui a sugestão, ao universo canino que me lê.
Então e aquelas pessoas que compram
roupa para os cães e andam com eles pela rua como se estivessem a
desfilar num cortejo alegórico? Ainda há dias me deparei com um Chihuahua
que empregava um vestido cor-de-rosa com folhos. Se se tratasse de um
individuo do sexo feminino: tudo bem. Se bem que continuava a ser
trágico e simplesmente errado. Mas o animal tinha pilinha! Isto é um
atentado à sexualidade daquele cão. Que fêmea é que quer praticar
rituais de acasalamento com um macho de vestido cor-de-rosa? Nenhuma Chihuahua-fêmea está disposta a estabelecer matrimónio com um Chihuahua-bicha para, anos depois, o apanhar na cama com outro Chihuahua-bicha com um laço amarelo nas orelhas. E é assim que surgem as chihuahuódepressões.
Trágico: deveras trágico.
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