As caras desesperadas. As revistas de há
dois anos. O corredor mal iluminado. Os quadros semiurbanos… Sim, isto
até podia ser uma música do Pedro Abrunhosa, mas para isso eu precisava
de uns óculos de sol, não é? Eu podia simplesmente ir buscá-los e criar
aqui um ambiente musical consideravelmente entretido, mas não me parece
adequado deixar o leitor à espera. Portanto: deixemos o meu momento de
glória musical para outra altura.
Coloco-vos agora uma questão, que é a
seguinte: quando é que os médicos estabeleceram esta estranha analogia
com a espécie feminina em dia de matrimónio?
A típica história da noiva que chega
atrasada? Dessa já tinha ouvido falar, tudo bem. Mas tendo em conta que,
quando (e se) me casar, desempenharei o papel de noiva – e não de noivo
–, estamos bem (supõe-se que não terei de esperar por seja quem for).
A minha dúvida é: mas por acaso eu e o
meu médico estabelecemos alguma relação de matrimónio em que concordámos
que eu desempenharia o papel de noivo? Acho que há aqui uma clara
confusão. É que eu, legalmente, nem tenho idade para casar! (E quando
casar, espero que não me levem a mal, gostaria de ser a noiva – e não o
noivo.) Eu até poderia pôr a hipótese de o ter feito, sei lá, em Las Vegas…
segundo as estatísticas, realiza-se um casamento de cinco em cinco
minutos. Mas não me parece. Os meus pais nem me deixam ir ao
supermercado comprar legumes sozinha (talvez porque confundo alfaces com
couves, e pepinos com courgettes); não me parece que me autorizassem a ir a Las Vegas
com o propósito de me casar com o meu médico de 52 anos, casado e com
duas filhas. Ou seja: agora levanta-se ainda mais uma questão que me
perturba o sono: serei eu a amante do meu médico de 52 anos?
Mas porquê esta teoria do matrimónio, Joana?
– perguntar-me-á o estimado leitor. Ora, não sei se é só a mim que isto
acontece, mas não há uma única vez em que eu marque uma consulta e o
médico chegue a horas. Marquei consulta para as 15h? Muito bem: então,
se estiver num dia de sorte, pode ser que às 17h já tenha sido atendida.
Por alguma razão, sinto que sou o noivo neste estranho relacionamento.
Não admira que me divorcie, em média, três vezes por ano! É de tremendo
mau gosto deixar-me à espera durante tanto tempo – não se faz.
Como se já não bastasse ficar toda uma
tarde à espera da “noiva”, ainda tenho de o fazer num corredor mal
iluminado, com uma velhota ranhosa a tossir para cima de mim, e tendo
como entretenimento nada mais que revistas de há dois anos atrás (isto
para não mencionar aquele terrível “cheiro a hospital”). E depois
admiram-se com a taxa de divórcios em Portugal.
Aposto que se vocês – médicos e médicas
deste mundo – começassem a chegar a horas às consultas, veríamos a
percentagem de casamentos bem-sucedidos a sofrer um aumento abrupto. Vá,
seus coraçõezinhos de manteiga… vão lá estudar a molécula de
hemoglobina e deixem os casamentos em Las Vegas para quem tem
tempo para isso. (E ai de si, Dr. Clementino, se não chega a horas à
consulta que tenho marcada para amanhã à tarde. Sim: pode considerar
isto uma ameaça.)
Muito bem escrito, Joana. Adoro a tua prosa alegre, divertida, jovem, irreverente e muito bem desenvolvida! Bom fim de semana!
ResponderEliminarOlá, Sonhadora! Muito, muito obrigada. Escrevo estas coisas por mera parvoíce. É sempre muito bom e surpreendente ver críticas tão positivas!
EliminarUm beijinho. :)